Degustação de safras do El Principal, o gran cru de Maipo
O El Principal, projeto nascido com DNA bordalês, provou sua origem nesta prova vertical, na qual, mais que entender a longevidade do vinho e as nuances de cada safra, mostrou personalidade para se colocar entre os maiores do país
O empreendimento nasceu em 1993, seguindo o modelo de sucesso no Novo Mundo, com a união entre um produtor de Bordeaux e um agente local. No caso da Viña El Principal, Jean-Paul Valette, então proprietário do ilustre Château Pavie (Valette vendeu a propriedade de Sain-Émilion em 1998); e o chileno Jorge Fontaine, dono do terreno no Maipo, aos pés dos Andes.
Nessa zona, chamada Pirque, a plantação das vinhas partiu com 54 hectares de Cabernet Sauvignon e Carménère, trazidas da tradicional Santa Rita; uma vez que Fontaine era também sócio dessa importante vinícola. Aliás, El Principal está bastante próxima de Santa Rita, mas adentrando em direção à cordilheira.
Solo e temperatura
Outra referência são os apenas 20 quilômetros de distância de Puente Alto, micro-zona onde nascem alguns dos mais ambiciosos tintos chilenos (Almaviva, Don Melchor e Viñedo Chadwick), novamente se aventurando nas altitudes mais elevadas. Enquanto Puente Alto está a cerca de 650 metros de altitude, os vinhedos mais baixos de El Principal partem de 750 metros e chegam a 950 metros, o que resulta em temperaturas médias de 2 a 3 graus inferiores à média em Maipo e com maior amplitude térmica.
Além do fator temperatura, o solo tem boa complexidade, com cascalho, limo e areia na parte baixa (próximo de afluentes do Rio Maio, que também formam terraços aluviais); e solo coluvial (mais pedregoso) na parte alta. Isso explica a vocação da propriedade tanto para tintos quanto para brancos. Assim, o atual enólogo Gonzalo Guzmán se atreveu a plantar a variedade branca espanhola Verdejo, que resulta em um dos mais interessantes da categoria no Chile (Kiñe, habitualmente presente no Top 100 anual de Prazeres da Mesa).

Principais rótulos
A linha de tintos se divide em El Principal, no topo; seguido de Memorias e Calicanto, respectivamente e em ordem decrescente de preço. Há apenas um rótulo em cada degrau da pirâmide, seguindo no conceito bordalês. O ícone nasceu em 1999, sempre com o modelo de mescla entre Cabernet Sauvignon e Carménère. A grande virada veio em 2005, com novos proprietários (hoje, a família chilena Handal) e a chegada do atual diretor de enologia Gonzalo Guzmán. Além disso, pôde contar, nos primeiros anos, com a assessoria de Patrick Léon (ex-Mouton e Opus One, falecido em 2018).
Ademais, Gonzalo fez um plano de expansão dos vinhedos para os atuais 90 hectares e para o caso do vinho principal se apoiou nas Petit Verdot, Cabernet Franc e Syrah, em detrimento da Carménère. Esta última variedade ainda está presente nos vinhedos, mas se destina a Memorias e Calicanto.
As novas variedades entraram em El Principal a partir da safra 2011 e junto com novas práticas enológicas, como menor frequência de remontagens; introdução de barricas de 500 litros em vez das bordalesas de 225 litros; e definição do blend apenas antes do engarrafamento. Isso, portanto, fez com que o vinho, segundo o próprio enólogo, “ganhasse em pureza, elegância e potencial de guarda”.
Confira a degustação
Na degustação, o ponto em comum entre os vinhos está na pureza do conjunto, em que a média de 15% de álcool é notada apenas na leitura do rótulo do vinho, assim como os 18 meses de estágio nas barricas, com tostados bem integrados e dando o polimento preciso aos (muitos) taninos. A vantagem da altitude dos Andes também se nota no ajuste entre a fruta madura e o frescor do vinho, sem recair sobre os mentolados de alguns Cabernet da região. Por fim, e não menos importante, é que a expressão do vinho o coloca em paridade com seus nobres e mais ilustres vizinhos; porém, seu preço, felizmente, ainda não os acompanha.
A vertical foi composta pelas quatro safras mais recentes lançadas pela vinícola, de 2015 a 2012. Vamos aos detalhes.
El Principal 2012
- 92 pontos
- 93% Cabernet Sauvignon e 7% Petit Verdot
Um ano de extremos, segundo Gonzalo. A brotação se deu com clima frio e chuvoso, seguido de um verão muito seco e caloroso. Na taça, o vinho mostra bom vigor, repleto de frutas vermelhas e negras maduras e sobremaduras, balanceadas por uma ótima acidez. Os taninos compactos e acetinados seguram a estrutura do vinho, que no final revela as especiarias da madeira (baunilha, cedro e toffee) com ervas tostadas.
El Principal 2013
- 94 pontos
- 87% Cabernet Sauvignon, 9% Petit Verdot e 4% Cabernet Franc
O vinho mais elegante do painel e com corte mais bordalês entre os provados. Um ano fresco e sem stress hídrico permitiu que a colheita tivesse início a partir da segunda semana de abril (tardia). Se por um lado essa safra não traz a intensidade dos outros anos, a complexidade e a integração são exemplares. Notas mais evidentes de frutas negras frescas, cedro, flores secas, terra e café. Taninos e acidez em perfeita harmonia e conectados por uma textura cremosa. Final redondo, sem arestas e com frescor reforçado pelas notas de tomilho e louro.
El Principal 2014
- 96 pontos
- 90% Cabernet Sauvignon, 7% Petit Verdot e 3% Syrah
Considerado um ano medianamente seco, o vinho traz a contradição de ter o menor teor alcoólico (14,5%) mas a maior intensidade aromática, o que é ótimo. Nariz com frutas negras maduras, folhas secas, hortelã e toffee. Embora bastante jovem, os inúmeros taninos mostram polimento exemplar, aportando estrutura sem agredir a boca. O frescor impressiona de igual forma e dá fluidez ao conjunto, que deve melhorar ainda mais com o tempo. Final muito longo, com fruta, mineral e especiarias.
El Principal 2015
- 95 pontos
- 92% Cabernet Sauvignon, 5% Cabernet Franc e 3% Syrah
O enólogo comentou que climaticamente o ano se comportou como 2012, porém na taça o vinho mostra um equilíbrio superior, com frutas negras maduras e concentradas, Earl Grey (chá-preto com bergamota), pão tostado e baunilha. Apesar da enorme intensidade e jovialidade, há ótima pureza, com taninos finos e acetinados e toque de especiarias no final (canela, cravo e malte) junto com a fruta. O vinho deve ir longe, ganhar integração e mostrar mais nuances no decorrer dos próximos anos. Premiará os pacientes. Desde a safra 2014 tem mostrado uma faceta mineral mais nítida.
* Os vinhos da Viña El Principal são importados com exclusividade pela Importadora Decanter