A versatilidade no prato
Paixão mundial, o café está presente na vida de muitos, seja de manhã, depois do almoço ou para acompanhar aquele lanche da tarde. Aqui ele virou protagonista e aparece em receitas deliciosas e exclusivas
“Um cafezinho, por favor!”, “Se não tiver café eu nem saio da cama”, “Me vê um pingado com leite”, “Um espresso e a conta”, “Tem café?”. Essas são frases corriqueiras do dia a dia de grande parte das pessoas. Não à toa o café é uma das bebidas preferidas dos brasileiros. Na maioria das pesquisas ele fica atrás apenas da cerveja. Mas você sabia que, antes de descobrirem os métodos de extração, secagem e torra, ele era de comer? Pois é, de acordo com o blog Have a Coffee, antigamente, no leste do continente africano, algumas tribos colhiam os frutos e preparavam um bolinho redondo, semelhante ao brigadeiro, a fim de dar força para caçar e participar de competições físicas. Convidamos dois chefs incríveis, Ana Luiza Trajano e Fábio Vieira, para criar receitas exclusivas para nós. E mostrar que esse ingrediente vai muito bem no prato.
À frente do restaurante Micaela, em São Paulo, está Fábio Vieira, parceiro antigo de Prazeres da Mesa e que topou de imediato nosso desafio. O chef conta que, apesar de ter começado a cozinhar tarde, com 30 anos, as coisas fluíram e ele se encontrou na nova carreira. Foi em um sobradinho da década de 1940, nos Jardins, que ele montou o Micaela – o nome do restaurante foi escolhido para homenagear sua bisavó espanhola –, em 2013, e apaixonou-se pelos ingredientes brasileiros e por suas pesquisas acerca deles.

Inspiração mineira

Para Prazeres da Mesa, Fábio preparou carne de panela com café mineiro e paçoquinha com grãos de café. “Gosto de desafio, pois o café não é um ingrediente que normalmente faz parte das minhas receitas. Mas esse tipo de coisa me inspira a utilizá-lo com mais frequência. Escolhi esses pratos por serem opções simples e que combinam perfeitamente com o café. Ele complementa os preparos e, caso você não queira – apesar de ser o objetivo –, não precisa ser o insumo central, embora traga notas especiais ao sabor”, afirma. No caso da paçoca, os grãos de café quebrados e torrados trazem, além de crocância, um leve amargor, que equilibra a doçura. Enquanto na carne de panela o café aparece contrastando com a cerveja, além de trazer um fundo tostado.
Para quem quiser se aventurar com receitas de café em casa, Fábio tem algumas dicas. “Ele pode ser o ingrediente principal, mas também pode ser um complemento, que a meu ver é mais interessante. Não se esqueça de pesquisar sobre os diferentes tipos, para se certificar de estar usando o que tem a intensidade desejada ou a doçura, a acidez, enfim, o melhor tipo para seu preparo. Para não errar, acredito que o bom senso é tudo. Devem-se lembrar das propriedades do ingrediente, como o amargor, que é uma das características principais do café e que pode acabar com a receita”.
No caso da carne de panela, Fábio sugere que o café usado seja mais frutado, como alguns mineiros, da Serra da Mantiqueira, que têm doçura característica. “Para a paçoquinha, como utilizo o grão torrado, o ideal é um café mais floral, com notas de frutas”, afirma.

Doce café

Ana Luiza Trajano é referência quando falamos de produtos brasileiros e sua valorização. À frente do Instituto Brasil a Gosto, que visa difundir a cultura brasileira por intermédio da gastronomia, ela é uma exímia pesquisadora de nossos insumos e faz o resgate de importantes receitas que se perderam. A filosofia do instituto é: “Por meio do diálogo e da troca de experiências, lutamos para que a autêntica cozinha brasileira, arraigada em técnicas, saberes e produtos, seja uma realidade nos fogões e nas mesas de todas as casas do país”.
Para Prazeres da Mesa, ela optou pelo pudim de café e pela fraldinha grelhada com molho de café e cachaça e mandioca salteada, mostrando, assim como Fábio, que o café faz boas combinações com bebidas alcoólicas. “Escolhi a receita do pudim de café porque remete a minha infância e tem relação com minha memória afetiva. Tia Silvia sempre fazia para mim. A da fraldinha é porque achei interessante fazer algo salgado. Para mim é mais fácil encontrar nas receitas clássicas brasileiras café relacionado ao doce. Acredito que uma carne assada peça sabores mais fortes, então, nesse caso, o café potencializa o sabor com a mandioca, que dá uma equilibrada”, diz Ana.
Ela diz que são preparos supersimples e que se o passo a passo for seguido corretamente não tem como errar. “A única coisa é que no pudim tem quem goste do mais lisinho ou com furinhos. Se for lisinho, use a temperatura mais baixa e cozinhe por mais tempo. Se for com furinhos, como o da foto, respeite o tempo dado na receita”, afirma.
Café todo dia
Ana garante que o café faz parte, com frequência, de suas receitas de doces e que é amante da bebida. “Eu não existo, se não tomar um café coado logo que acordo! Quando uso café em receitas, são preparos clássicos. Bala de café, pudim de café, pingado, coisas que todo mundo conhece”. Apesar disso, ela alerta para o fato de o café ter um sabor predominante. Por isso é preciso tomar cuidado para não colocá-lo com algo muito delicado e ter apenas o sabor do café.
Animou-se com as dicas? Então, que tal se aventurar e buscar seu tipo preferido de café para incluir em seus preparos do dia a dia?

* Reportagem publicada na edição 181 de Prazeres da Mesa, setembro de 2018