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Chef da maresia

Rui Paula começou a carreira comandando um restaurante de comida caseira. Hoje, à frente de três renomadas casas contemporâneas, o cozinheiro prova que para atingir o sucesso é preciso muita dedicação

Chef Rui Paula - CHEF DA MARESIA
Fotos Ricardo D'Angelo

Convidado pelo restaurante Fleming’s, de São Paulo, para realizar uma série de jantares especiais em comemoração do aniversário da casa, o português Rui Paula não pensou duas vezes e montou logo um cardápio focado em um ingrediente: o bacalhau. À primeira vista, um chef português cozinhar bacalhau pode parecer um grande clichê. Mas, durante os cinco anos em que teve um restaurante no Recife, Rui descobriu que os brasileiros nunca perdem a oportunidade de apreciar o peixe. “Adoro trabalhar com a maresia. Peixes e frutos do mar são o que mais gosto de cozinhar. Sentir o cheiro do mar é como um perfume para mim”, diz o chef, que tem como prato favorito arroz de polvo com filé do mesmo molusco. “A minha avó fazia especialmente para mim, sempre no Natal, e eu comia enquanto o resto ficava só com o bacalhau”, afirma.

A mesma avó que fez Rui se apaixonar pelos ingredientes do mar foi, de certa forma, uma das responsáveis pela inserção do chef na cozinha. “Ela era uma exímia cozinheira, toda a minha família gostava de comer bem. Vivíamos em uma propriedade de lavoura com gado. Passei a infância nesse ambiente, onde tudo era feito de forma caseira”, diz. Com um cenário desses não poderia ter sido diferente, e Rui aprendeu a cozinhar ainda pequeno, fosse no dia a dia, quando preparava o almoço para o irmão, ou nas festas de família, ele sempre estava por trás das caçarolas. “Mas fui estudar marketing e fiz outras coisas até perceber que cozinhar era mesmo o que eu queria fazer”, afirma.

“Adoro trabalhar com a maresia. Peixes e frutos do mar são o que mais gosto de cozinhar. Sentir o cheiro do mar é como um perfume para mim”

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O início

Foi só aos 26 anos, em 1994, que lhe surgiu a ideia de trabalhar em cozinha. “Eu nunca tinha estudado gastronomia, mas pensei ‘eu até sei fazer comida tradicional’”, diz. Com a ajuda da mulher, Cristina Canelas, o português abriu o restaurante Cêpa Torta. “Era uma casa só de culinária tradicional e estávamos indo bem, mas em um certo momento comecei a me sentir inferior aos outros. Eu ia a restaurantes e via pratos que não sabia fazer, via técnicas novas que não havia aprendido”, diz.

Nesse momento, o então cozinheiro percebeu que o que sabia fazer não era o suficiente. “Tomei a decisão de que, se era para levar a profissão a sério, eu precisava estudar. Do meu restaurante, enviava e-mails pedindo estágio em diversas casas, tanto em Portugal quanto no resto do mundo.” E foi assim que o cozinheiro conseguiu realizar uma série de estágios na França, na Inglaterra e na Espanha, onde passou pelo premiado El Celler de Can Roca, em Girona.

No decorrer dos anos, sua cozinha tradicional foi se transformando em contemporânea e criativa e, passados 15 anos à frente do Cêpa Torta, o chef percebeu que era chegado o momento de desenhar uma nova casa. Com margem para o Rio Douro, o DOC foi criado para ser um lugar para degustar, ousar e comunicar. Inaugurada em 2007, a casa foi a primeira de uma sucessão de restaurantes de sucesso comandada por Rui Paula. “O DOC foi meu primeiro restaurante com magnitude global. A casa ainda mantém um ar mais tradicional, mas com uma gastronomia bem mais elaborada”, afirma.

A consagração

Três anos depois, veio o DOP, que fica localizado no Palácio das Artes, na área histórica do Porto. “O DOP tem ar cosmopolita, é uma cozinha pensada para receber os diferentes tipos de pessoas”, diz. Por ser um restaurante que atende muitos turistas, o cardápio do DOP faz uma releitura da cozinha clássica portuguesa, sempre enaltecendo os insumos locais.

Por fim, em 2014, Rui teve seu ano de ouro. Além de estrear como jurado no programa MasterChef Portugal, abriu a Casa de Chá da Boa Nova. O projeto ambicioso, em Leça da Palmeira, foi assinado pelo renomado arquiteto Pritzker Siza Vieira e foi classificado como Monumento Nacional, sendo integrado ao Roteiro Internacional de Arquitetura. Na gastronomia, a casa também ganhou destaque e desde 2016 conta com uma estrela Michelin. Da cozinha, saem apenas receitas com peixes ou frutos do mar, os favoritos do chef. “É um restaurante mais restrito. Ali, servimos menu degustação e seguimos uma linha mais avançada nas técnicas. Mas todos os meus restaurantes oferecem bons serviços, bons vinhos e muito sabor”, diz Rui. Durante esse período, de 2013 até o início deste ano, ele ainda arranjou tempo para comandar no Recife um restaurante que leva seu nome.

O futuro

Engana-se quem pensa que o estrelato fez o chef se acomodar. “Enquanto estiver com saúde, não paro”, afirma Rui, de forma categórica. “O futuro a Deus pertence, mas tenho vários planos. Quero trabalhar com monoproduto. Talvez abrir um restaurante mais acessível. Focado em apenas um ingrediente”. Em seu cardápio para o Fleming’s, o chef já deu uma provinha de que esse modelo tem tudo para ser sucesso. O bacalhau, estrela da noite, foi transformado em carpaccio e creme. Além de ser servido em duas versões assadas, uma em crosta de broa e a outra com um purê de grão-de-bico. Do menu de seis etapas, apenas as sobremesas não levaram o peixe. Leite de creme em massa folhada e frutas. E a especialidade do chef, o pudim de priscos do abade com sorbet de framboesa, finalizaram a noite.

O menu preparado por Rui fez tanto sucesso que, então, para a felicidade dos clientes, algumas receitas ficarão no cardápio fixo do Fleming’s. Mas, para provar as outras como o imbatível pudim, só mesmo visitando as casas do chef em Portugal. Ou, então, reproduzindo-a em casa, uma vez que o chef passou a receita do pudim para Prazeres da Mesa.

Pudim abade de priscos com abacaxi e lima
Pudim de priscos do abade com abacaxi e lima

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Stephanie Vapsys

Foi vendendo cupcakes na feira de empreendedorismo da escola, aos 15 anos, que Stephanie Vapsys se encantou pela confeiteira e, posteriormente, pela gastronomia. A jovem que nunca recusa um docinho ou um convite para jantar, decidiu cursar jornalismo na Faculdade Cásper Líbero por ser fã de literatura e fascinada por contar boas histórias. Desde 2015, na redação de Prazeres da Mesa, a repórter teve a oportunidade de conviver diariamente com sua grande paixão. Depois de grandes contribuições, partiu para novos desafios no início de 2020, deixando a equipe de Prazeres da Mesa.

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