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Como anda a Cabernet Franc?

Essa nobre uva de origem francesa volta a ser tema da coluna com bons exemplares, mas também há espumantes e outras novidades que merecem ser provadas

Cerca de cinco anos atrás, esta coluna esteve dedicada a uma importante uva francesa: a Cabernet Franc (“A hora da Cabernet Franc”, PDM, abril de 2015). O que motivou aquele texto? Explico. A uva, antiquíssima, considerada uma das progenitoras da Cabernet Sauvignon e peça fundamental de um dos mais tremendos vinhos do planeta, o Château Cheval Blanc, foi sempre relegada, em geral, fora alguns vinhos do Loire, a um segundo plano, como simples coadjuvante, no papel de uva de corte.

Na época, especialmente no Chile e na Argentina, várias vinícolas começaram a focar nela como uva stand-alone, fonte de vinhos varietais premium. Foram alguns desses goles que, na ocasião, ocuparam este espaço. O Brasil, de certa forma, esteve por um tempo à frente dessa onda. No começo da década de 1980, a Cabernet Franc deu vida por aqui a rubros muito interessantes. Depois, ela esvaeceu-se, saiu pouco a pouco de cena, talvez por problemas sanitários em suas videiras.

A julgar pelos exemplares que chegam ao mercado (e pelo preço de alguns deles) a Cabernet Franc no Cone Sul parece continuar de vento em popa. Mas, afinal, com esse passado de saborosos goles tupiniquins e em meio ao cenário atual, a quantas anda hoje a variedade por aqui?

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Conversando a respeito (e tentando definir o tema de uma próxima degustação) com um grupo de amigos pairou a mesma pergunta. A resposta à dúvida, claro, foi uma prova às cegas (sem saber o vinho específico que está em cada copo) de exemplares nacionais da cepa. O resultado foi muito bom. Colocou em evidência goles atraentes, plenos de fruta e, de quebra, com custo mais em conta que muitos dos similares dos nossos vizinhos.

Dois dos destaques da prova (e um terceiro pinçado à parte) podem ser encontrados a seguir. Aliás, o evento teve um benéfico efeito colateral. Descortinou uma jovem empresa gaúcha, a Família Bebber, dona de um bom elenco de rubros (um par deles aparece junto a seu Cabernet Franc) e na qual vale a pena ficar de olho.

Na coluna há também novidades. Entre elas, por exemplo, um atraente espumante espanhol de Valencia e um tinto hedônico, exuberante, nascido na Gasconha, em pleno sudoeste gaulês e que tem no corte uma parte de Cabernet Franc.

ARGENTINA

Domaine Bousquet (Mendoza)

Originária de Carcassone, no sudeste francês, a família Bousquet se estabeleceu em Mendoza (no Vale de Uco, em terras de altura, hoje uma das joias da coroa vitivinícola platina) no fim da década de 1970. Hoje, são donos de um portfólio de goles de qualidade consistente desde os básicos até os topo de gama. Menção entre eles para a dupla de vinhos orgânicos a seguir.

Sauvignon Blanc Orgânico 2019

Nada por aqui das frutas tropicais maduras (com forte participação do maracujá) tão habituais nos goles da variedade. Firmes tons minerais e de suave tostado temperam frutas cítricas (limão-siciliano, leve grapefruit) misturadas a traços de atraente lichia. Tem paladar saboroso e equilibrado na acidez. Um vinho gastronômico ideal para um peixe grelhado (avaliação: 88 pontos em 100).

Malbec Orgânico 2019

Rubro de corpo médio, redondo e, como o anterior, bem equilibrado. A fruta (ameixas maduras, leve groselha) com suaves toques florais e de pimenta domina o aroma e o sabor. Um vinho prazeroso e descomplicado que se bebe fácil (89/100). Ambos 56,90 reais, no Emporium São Paulo; emporiumsaopaulo.com.br

ESPANHA

Chozas Carrascal (Utiel-Requena)

Esta é a segunda vez que a adega da Província de Valencia, no centro-leste ibérico ocupa espaço na coluna. Um par de anos atrás foi um de seus belos tintos que a trouxe à tona. Volta agora com um espumante que mescla uvas autóctones e francesas e tem desempenho muito atraente para sua faixa de preço.

Roxanne Brut

Corte de uvas Macabeo (ou Viura) e Chardonnay. Frutas brancas, suaves cascas cítricas e tons minerais bem sustentados por uma agradável acidez aparecem no aroma e no sabor. Mostra bom corpo, cremosidade e persistência (88/100, R$ 59,90). Mambo; mambo.com.br

Bodegas Bonaval (Extremadura)

A Bonaval é o braço dedicado às borbulhas finas da Lopez Morenas, uma casa vitivinícola da Extremadura, sudoeste espanhol, forte na produção de vinhos de volume, engarrafados em bag-in-box e tetrapak. A adega já marcou também presença na coluna com suas borbulhas. Retorna com um Brut básico que merece novamente destaque.

Viña Adelaida Brut

Tem perfil robusto, bom corpo e bolhas abundantes. Maçãs assadas, leves toques cítricos e de mostarda tomam conta de paladar amplo e com marcada acidez que lhe dá vivacidade (90/100, R$ 79,90). Emporium São Paulo; emporiumsaopaulo.com.br

BRASIL

Família Bebber (Flores da Cunha, RS)

A jovem empresa (seus primeiros vinhos foram os da safra 2014) pertence a Valter Bebber e seus dois filhos, Rafael e Felipe (enólogo responsável pelos vinhos). O port-fólio da casa está integrado por goles nascidos de uvas oriundas de parcerias com viticultores de diferentes cantos gaúchos. Os tintos provados primam pela fruta em bom equilíbrio com uma dose moderada de madeira.

Sentiero Merlot 2017

Mescla uvas de vinhas de três localidades: Nova Pádua, Bento Gonçalves e Garibaldi. Passou cerca de 12 meses em barricas de carvalho americano e francês. Um rubro redondo de corpo médio, vivaz, com bom conteúdo de frutas vermelhas e leve toque de especiaria que marca um final de boa persistência (89/100, R$ 79).

Sentiero Cabernet Franc 2014

Um dos primeiros vinhos elaborados pela vinícola. É um blend de uvas de vinhedos em Caxias do Sul, Pinto Bandeira e Bento Gonçalves. Teve estágio em madeira similar ao anterior. Fruta, compotas e toques de suave couro, folhas secas e canela marcam aroma e sabor. Tem paladar macio, com bom corpo e acidez e final longo e agradável (90/100, R$ 79).

Família Bebber Touriga Nacional 2017

Elaborado com uvas da Serra do Sudeste. Estagiou um ano em barricas de carvalho francês e americano. Ameixas pretas frescas e muito maduras junto a pinceladas florais dominam um paladar aveludado e untuoso embrulhado em uma boa acidez. Tem final frutado tão delicioso quanto persistente (91/100, R$ 89). Os três à venda na Vinhos e Vinhos; vinhosevinhos.com

Don Giovanni (Pinto Bandeira, RS)

A vinícola talvez seja mais conhecida por seus vigorosos espumantes, mas em seu repertório há também rubros interessantes, como a edição 2015 do Cabernet Franc, que merece ser conferido.

Don Giovanni Cabernet Franc 2015

Teve 12 meses de estágio em carvalho. Mostra aroma e sabor intensos nos quais aparecem compotas e geleias temperadas com pinceladas de especiaria doce. O conjunto marca um paladar sem arestas e com bom final (89/100, R$ 70). vinhosevinhos.com

Luiz Argenta (Flores da Cunha, RS)

A moderna adega da casa e seus belos vinhedos (comprados em 1999 da lendária Granja União) marcam a paisagem da cidade de Flores da Cunha. Do variado repertório etílico da casa com sólidos tintos, brancos e espumantes, destaque aqui para um rico Cabernet Franc.

LA Clássico Cabernet Franc 2015

Frutas pretas e vermelhas, leve cravo e especiaria (fruto talvez dos seis meses em contato com carvalho francês) dominam a cena. Tem taninos finos e firmes que brindam ao vinho agradável textura. A fruta aparece também no fim de boca com boa persistência (90/100, R$ 64). vinhosevinhos.com

Casa Perrini (Farroupilha, RS)

Dona de uma coleção de marcas que abriga desde vinhos de mesa até goles finos, a vinícola de Farroupilha tem nesse último departamento um respeitável canto reservado aos espumantes. O Nature (Brut sem adição de açúcar) é o topo de gama da ala das borbulhas.

Casa Perrini Nature

Corte de Chardonnay e Pinot Noir. Aromas de pão fresco e suaves avelãs surgem da garrafa logo após a remoção da rolha. Na taça, frutas brancas e cítricas se agregam ao conjunto preenchendo um paladar vivaz pela acidez e cremoso pelas bolhas finas e abundantes (90/100, R$ 95). vinhosevinhos.com 

FRANÇA

Château Bauvallon (Bordeaux)

Outro retorno. O Château Bauvallon integra o acervo do grupo Ballande, uma companhia dedicada ao comércio e à produção de vinhos, com várias propriedades na região. Na sua estreia com a safra 2016, Bauvallon se mostrou como uma das melhores pedidas bordalesas para sua faixa de preço. Com a versão 2018 que acabou de aportar, o rubro gaulês repete a performance.

Château Bauvallon 2018

Elaborado com uvas Merlot (70%) e Cabernet Sauvignon, não teve contato com madeira. Fruta intensa (framboesas, groselhas) temperada por tons herbáceos e de incenso dominam um paladar atraente com taninos firmes e finos. Tem final frutado longo. (90/100, R$ 102,46).

Domaine Horgelus (Gasconha)

O domaine com base em Montréal du Gers, em plena Gasconha, no sudoeste do país, foi criado em 1978 e conta hoje com 90 hectares de vinhas. Yoan Le Menn, enólogo e filho do fundador, Joseph Le Menn, assina os vinhos. Eles dispensam madeira e são vinificados de maneira a destacar ao máximo a fruta. O Rouge de Gaia, último desembarque rubro da casa é prova clara disso.

Rouge de Gala 2018

Quatro variedades entram em sua fórmula: Merlot (30%), Cabernet Franc (25%) Cabernet Sauvignon (25%) e Tannat. A fruta (cereja, amora, framboesa) bem condimentada por tênues pinceladas terrosas e realçada por uma bela acidez, toma conta de um paladar aveludado e delicioso do início ao persistente final (92/100, R$ 99,19). Os dois, na Premium; premiumwines.com.br.

*Coluna de Jorge Carrara publicada na edição 199 (março 2020), de Prazeres da Mesa.

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